Paciente morre em RO um mês após conseguir decisão na Justiça para ter direito à alimentação especial

Família denunciou a falta de alimentação especial e conseguiu o benefício para outras 750 pessoas em Rondônia. Antônio não resistiu às complicações da doença e faleceu no início da semana.

Antônio Oliveira morreu aos 70 anos após meses lutando contra um câncer. O paciente ficou conhecido em Rondônia depois que o filho, Fernando Oliveira, denunciou a falta de alimentação especial para o pai e conseguiu na Justiça uma decisão que beneficiou outros 750 pacientes.

A família, junto com o paciente, veio do interior do Acre em novembro de 2020, quando descobriram a doença e conseguiram uma vaga no Hospital de Amor, em Porto Velho.

Por causa do tratamento e do tumor, Antônio não conseguia se alimentar do modo convencional e precisou utilizar uma sonda nasoenteral, por onde recebia uma alimentação especial capaz de manter todos os nutrientes necessários no corpo.

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Essa alimentação era cedida pelo governo do Estado, mas durante o mês de março começou uma redução que afetou vários pacientes. Em maio, a distribuição foi completamente suspensa. Na época, Fernando contou à Rede Amazônica que precisava arcar com os custos para manter o pai nutrido, mas não possuía condições de continuar fazendo isso por muito tempo.

“Eu vi pacientes irem para a emergência do hospital porque não tinham dieta, pacientes que estavam agendados para cirurgia e não fizeram porque não estavam nutridos, pacientes que abandonaram o tratamento, pacientes que arrancaram a sonda… foram 90 dias de muito sofrimento”, contou o filho.

Luta coletiva

 

Movido pelo desejo de ver o pai melhorar, o filho entrou em contato com órgãos públicos para denunciar a situação. Através da Defensoria Pública ele conseguiu entrar com uma ação e no fim de agosto a Justiça emitiu uma sentença que obrigou o Estado a fornecer o alimento especial.

Através da decisão, foi iniciada uma ação civil pública coletiva com o objetivo de beneficiar cerca de outros 750 pacientes que também dependiam da nutrição para continuar o tratamento: “eu chamo isso de vitória da vida”, disse.

‘Tarde demais’

 

Apesar da vitória coletiva, quando Antônio conseguiu ter acesso novamente à dieta especial já havia perdido sete quilos e estava bem desnutrido.

“Essa dieta é o único alimento que nutre ele. E meu pai passou praticamente três meses sem”.

No último dia 30, Antônio precisou ser socorrido pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) até um hospital em Porto Velho, pois sangrava muito. No hospital, a família descobriu que se tratava de uma hemorragia tumoral e o paciente precisava passar por uma traqueostomia para conseguir respirar e não “se afogar” com sangue.

“E meu pai já estava com perda de peso grave e com cirurgia. Isso fez, talvez, com que ele não resistisse porque já estava debilitado, mesmo seguindo a dieta, mas ainda era muito pouco tempo para recuperar”, lembra o filho.

Na madrugada da segunda-feira (4), Antônio não resistiu às complicações da doença e faleceu em Porto Velho. A família fez o translado do corpo até Brasiléia (AC), onde ele foi velado e sepultado no início da semana.

‘O herói das nossas vidas’

 

Paciente morre em RO um mês após conseguir decisão na Justiça para ter direito à alimentação especial — Foto: Fernando Oliveira/Arquivo Pessoal
Paciente morre em RO um mês após conseguir decisão na Justiça para ter direito à alimentação especial — Foto: Fernando Oliveira/Arquivo Pessoal

Apesar de passar por um momento doloroso, após 11 meses com a esperança de que o tratamento pudesse prolongar por anos a vida do pai, Fernando conta que no fundo há uma sensação de vitória. Isso porque através da vida e história do pai, outras centenas de pacientes conseguiram o direito à alimentação.

“É uma sensação de alívio para mim. De missão cumprida como filho, mas de alguma forma de ter ajudado mais pessoas também”, diz.

Quando começou a usar sonda, Antônio já não conseguia mais falar e se comunicava através de sinais. Sempre confiante, aguardando o momento de retornar para casa.

“Mesmo nos momentos mais difíceis ele colocava um legalzinho para dizer que tava tudo bem que ia dar tudo certo”, conta. 

O filho descreve o pai como uma pessoa dedicada, batalhadora, valente e que lutou até o último minuto pela vida. “Ele deixa um legado de bom homem, pai e esposo que dedicou a vida à família. O herói das nossas vidas”.